domingo, novembro 29, 2009

Rua da Cinza


Nesta foto (anos 60?), cedida pela Lena do Américo Morais, que, como eu, foram gente na Rua da Cinza, podemos ainda ver as «casinhas» que avançavam das moradias, à guisa de logradouro de arrumos. A «casinha» branca era do Ti Zé Violas e servia, simultaneamente, de oficina de sapateiro e de posto de correio, sendo, também, mormente de verão, uma espécie de clube onde se juntavam certas pessoas para um bom jogo de damas ou para uma animada converseta, sempre com o contributo bem homorado do anfitrião, enquanto batia a sola ou ponteava os sapatos.
Aqui vão uns versinhos à minha rua:

A Rua da Cinza é minha,
Herdei-a por nascimento.
Guardo-a, bem guardadinha,
Junto do meu pensamento.

Saindo do Fundo da Estrada,
Finda na Rua Direita.
Mesmo antes de ter calçada
Já ela era a mais perfeita.

Tinha casas, muitas casas,
Alegria e foliões;
Tinha rondas, tinha arruadas,
E flores nas procissões!

Tinha vida, muita vida,
Trabalho e divertimento;
Povo de cabeça erguida,
Salvador em movimento!

A Rua da Cinza é minha,
Herdei-a por nascimento.
Deixá-la-ei, inteirinha,
Quando fizer testamento.

sexta-feira, novembro 20, 2009

A água do Salvador


Mais uma jóia de imagem, de fim dos anos cinquenta / princípio dos sessenta, que mostra um naipe de belas moças de que o nosso Salvador sempre foi fértil.
Encostadas ao chafariz fundeiro, de costas para a Rua Direita e para a imponente casa do Dr. Júlio Moutinho (actual Centro de Dia), temos: a Arlete, a Alda Frederico, a Lurdes Leitão, a Maria Alice, a Nazaré, a professora Maria Natália, a Maria Augusta e, ainda, de mais tenra idade, julgo ver a Severiana Candeias Lopes, a Maria Manuela (Manecas) Vicente Lopes, a Zezinha Silva Raposo (com a mão sobre a vista) e, finalmente, um triciclista, que creio ser o Manuel Tavares (Manelito).
Tinha o Salvador de outros tempos coisas muito boas, algumas delas só conhecidas dos mais velhos! E não falo já da juventude, aqui tão presente e tão distante: refiro-me, agora, e com acentuada nostalgia, à água leve e puríssima, brotada das nascentes da serra da Santa Sofia, que aqui vemos correr abundantemente.
Naquele tempo, é claro!

quinta-feira, novembro 12, 2009

Outros balcões altos


Antes do aparecimento dos novos materiais de construção, o Salvador de outras décadas tinha bonitos balcões feitos de grandes e trabalhados blocos de granito, que, na maioria dos casos, definiam a dignidade, e, mais propriamente, as posses dos seus proprietários: eram as clássicas mansões de «balcão alto» dos mais ricos e abastados da terra.
Não é o caso desta imagem de 1961, que mostra um balcão com uma certa altura, mas em que, nem as pedras nem o trabalho de pedreiro, nos sugerem tal situação, mas uma casa de gente simples, embora vestida a propósito e pondo o seu melhor semblante para o retrato que há-de ser expedido para o familiar distante, a fim de servir para mitigar saudades e para abreviar o regresso.
É família de José Afonso e Adélia dos Santos, naturais de Proença-a-Velha, que, no final dos anos vinte, vieram para o Salvador, onde viveram toda uma vida e onde estão sepultados.

domingo, novembro 08, 2009

Família Leitão


A foto é da segunda metade dos anos setenta. Nela vemos um casal idoso, o senhor Leitão e a senhora Celeste, entre filhos e netos. Foi tirada em Monsanto, mas com um pé no Salvador (falamos assim, porque o referido casal passou a maior parte da sua vida na nossa terra, onde ele exercia a profissão de guarda-fiscal, e onde a família cresceu).
O jovem par que se vê atrás é o Henrique Leitão e a Lena. Quanto aos restantes, são o Manuel Sebastião, a Lurdes e os filhos de ambos: a Fátima, de cócoras; a Filomena, de mão na cintura, a Fernanda e o Nelson.
O «Manel» deixar-nos-ia pouco tempo depois de feita esta imagem; o Nelson partiria também enquanto jovem e a Fernanda conheceu uma viuvez precoce há bem poucos dias.
A Lurdes, que tem agora perto de oitenta anos, acumulou já uma vasta experiência de sofrimento: os pais, os sogros, um irmão, o único cunhado, o marido, o filho, o genro, todos lhe foram arrebatados, sem dó nem piedade.
Dizem que o sofrimento redime porque Deus o ligou ao amor. Mas lá que é injusto, isso é!

quarta-feira, novembro 04, 2009

Belo ramalhete de flores


Olhem só que belo ramalhete de flores que vos trago hoje, nesta magnífica foto de meados da década de cinquenta! Era assim, belo e florido, o Salvador do meu tempo: terra de caras lindas, como as que aqui vemos.
O «ramo», disposto em pirâmide sobre o «Penedo da Saudade», transborda boa disposição e irradia felicidade. Privilégios da juventude!
Este barroco, situado no cimo da serra, era passeio obrigatório para os jovens, que ali se reuniam, para conversarem, nos domingos à tarde e, por vezes, também nas noites enluaradas e cálidas de verão os rapazes ali permaneciam, divertidos, a contar anedotas, até altas horas da noite.
Identificamos, na imagem, de cima para baixo e da esquerda para a direita, a Nazaré, a Manecas, a Lurdes Raposo, a Maria Silva, a Maria Augusta, a Alice França, a Maria Alice, a Arlete, a Helda, a Lurdes Leitão, a professora Maria Natália, a Alda Frederico, a Stelinha e a Zezinha. Se me enganei, corrijam-me.
Homenageamo-las a todas, mas com saudade as que já partiram.

domingo, novembro 01, 2009

Um casal salvadorense


O ti José Cigano e sua mulher, a ti Antónia Rosalina, moravam na íngreme Rua da Salgadeira, à mão direita de quem sobe, logo a seguir ao canto dos Francisquinhos.
Era um simpático casal que vivia do seu trabalho: ele, guarda do Vieiro nos tempos em que das minas se extraíam toneladas e toneladas de minério de ferro, que grandes camionetas transportavam até às siderurgias; ela levava a vida atrás de um tear, que accionava com agilidade e destreza, e do qual se faziam ouvir, ao redor, os sons sincronizados, primeiro da lançadeira a correr entre a urdidura e a trama, para um lado e para o outro, e, depois, a batida vigorosa do pente contra o encosto. Era um afã que se repetia vezes sem conta, até que se acabasse a toalha, o panal ou a manta que a freguesa encomendara...
A fotografia, tirada em 1946, destinava-se ao filho António, que vivia em Moçambique, e foi por isso que ambos se aperaltaram como se vê.
As vistas foram as possíveis daquele tempo: o tosco muro de alvenaria de um quintal, e, ao longe, um pedaço da bonita serra do Salvador.